Bibi Ferreira, a Imortal dos Palcos
Lino Tavares
Ninguém se torna artista. A arte não é um aprendizado, é um atributo que nasce com determinadas pessoas, necessitando tão somente de espaço e condições materiais para se expressar aos olhos de todos. Isso não significa dizer que aquele que não traz esse dom de berço não possa atuar no meio artístico. Contudo, jamais alcançará no tipo de arte que pratica a unção divina da imortalidade. Quando um artista de nascimento despede-se deste mundo, após encantar gerações ao longo de décadas, costuma-se dizer que perdeu-se uma peça humana de difícil reposição. Mas quando esse artista que partiu fulgura muito acima da média dos astros que lhe são pares, aí a sensação que fica é a de um ser insubstituível, dada a raridade do esplendor com que desfilou de forma apoteótica nos palcos da vida por onde passou.
Bibi Ferreira, a estrela de primeiríssima magnitude que nos deixou neste 13 de fevereiro de 2019 representa sem a menor sombra de dúvida esse ser artístico insubstituível, que aflorou no mundo sob a bênção dos deuses de todas as artes. Tal como Chico Anysio, no universo do humor, e Charles Chaplin, no mundo do cinema, Bibi foi primeira e única na forma sui generis de expressar a verve da arte polivalente que lhe corria nas veias. No âmago de seu pendor artístico, conviviam a Bibi rainha das artes cênicas e a cantora de nível internacional, que encantava plateias com apresentações para guardar na memória, Era possível ouvi-la cantar e interpretar em solo brasileiro o repertório de célebres cantoras como Amália Rodrigues e Edith Piaf como se a gente estivesse vivendo esses momentos mágicos nos palcos inebriantes do Cassino Estorial de Lisboa e do Olympia de Paris.
Abigail Izquierdo Ferreira ( nome de batimos da estrela Bibi Ferreira) nasceu no Rio de Janeiro em 1º de junho de 1922. No seu vasto e versátil currículo figuram as denominações artísticas de atriz, diretora, apresentadora, cantora e compositora. Trazia na origem genética o dom artístico do pai ator gigante Procópio Ferreira e da mãe destacada bailarina argentina Aida Izquierdo. Antes de completar o primeiro mês de nascimento, com apenas 24 dias de vida, os desígnios que a faziam uma predestinada da arte de representar colocaram-na no palco na peça teatral "Manhãs de Sol", no lugar de uma boneca que não fora encontrada momentos antes de o espetáculo começar. Bibi Ferreira estreou profissionalmente nos palcos em fevereiro de 1941, interpretando "Miradolina", na peça teatral "La locandiera". Depois de passar pelo corpo de baile do teatro municipal, influenciada pela mãe bailarina, entrou para a companhia teatral do pai Procóprio Ferreira até montar sua própria empresa de teatro, reunindo famosos do gênero, como Cacilda Becker, Maria Della Costa e a diretora Henriette Morineau.
Algum tempo depois emigrou artisticamente para Portugal, onde atuou como diretora, alcançando notável sucesso, tendo brilhado também nos Estados Unidos e em outras partes do mundo. Enumerar a trajetória completa dessa mulher virtuosa inconfundível de todos os palcos seria impraticável no limitado espaço deste artigo que se propõe a homenagear a ilustre brasileira que trocou a dimensão terrena pelo plano maior da Divindade, deixando-nos um legado cultural de valor inestimável. Nada mais apropriado, portanto, que se conclua esse tributo a Bibi Ferreira, dizendo simplesmente "obrigado, musa imortal por teres feito de tua fecunda existência uma cascata de luz, câmera e ação que encantou milhões de brasileiros e projetou o Brasil artisticamente, de forma magnífica, em terras do além-mar".
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